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A incrível jornada da evolução do inglês: como a língua mudou em mil anos

A língua inglesa, como qualquer língua viva, está em constante transformação. Assim como sociedades evoluem, palavras, sons e estruturas acompanham o ritmo das mudanças culturais, políticas e tecnológicas. Um dos exemplos mais impressionantes dessa evolução está na comparação das versões do Salmo 23, um dos textos mais conhecidos da Bíblia. A imagem mostra quatro estágios do inglês: o Old English (800–1066), o Middle English (1100–1500), o Early Modern English da Bíblia King James (1611) e o Modern English (1989). Em mil anos, o idioma passou de algo quase indecifrável para o inglês que usamos hoje.

Comparação das quatro versões do Salmo 23 em inglês — Old English, Middle English, Early Modern English e Modern English — mostrando como o idioma evoluiu em mil anos, de “Drihten me raet” a “The Lord is my shepherd.”

Old English (800–1066)

O Old English, ou anglo-saxão, era a língua falada na Inglaterra antes da conquista normanda. Ele tem raízes germânicas profundas e é quase irreconhecível para um falante atual de inglês. No texto, lemos:“Drihten me raet, ne byth me nanes godes wan.”


Essa frase significa: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará.” Palavras como Drihten (Lord) e raet (guides) lembram que o inglês antigo se parecia muito mais com o alemão do que com o inglês moderno. A estrutura gramatical era complexa, com casos (como no latim), gêneros e muitas terminações diferentes para verbos e substantivos. O vocabulário era fortemente germânico, e a pronúncia era gutural, dura, próxima do nórdico.


O Old English mostra um período em que a língua ainda era local, tribal, marcada por dialetos regionais. Era o idioma dos reis anglo-saxões e dos monges copistas, muito antes da Inglaterra se tornar uma nação unificada.


Middle English (1100–1500)

Após a invasão normanda de 1066, a Inglaterra passou por uma revolução linguística. O francês se tornou a língua da corte e da administração, enquanto o povo continuava falando o antigo inglês. Com o tempo, as duas se misturaram, criando o Middle English. No Salmo 23, o texto aparece assim:“Our Lord gouerneth me, and nothyng shal deFAILEN to me. In the sted of pastur he sett me ther. He norissed me upon water of fylling.”


Aqui, já se percebem palavras mais familiares, como Lord, pastur, water, mas ainda há grafias diferentes e sons que não sobrevivem no inglês atual. O Middle English foi o idioma de Geoffrey Chaucer, autor de The Canterbury Tales, e marcou a simplificação da gramática: as declinações começaram a desaparecer, e a ordem das palavras passou a definir o sentido da frase.


O contato com o francês trouxe milhares de novos vocábulos — government, justice, religion, beauty, peace. Também começaram a surgir variações regionais mais claras. O inglês deixava de ser uma língua puramente germânica para se tornar uma fusão entre o germânico e o latim, mediado pelo francês.


Early Modern English (1611)

O próximo salto aparece na versão da King James Bible (1611).“The Lord is my shepherd, I shall not want. He maketh me to lie down in green pastures. He leadeth me beside the still waters.”


Agora o texto soa completamente compreensível, mesmo para um leitor atual. Essa versão marcou a consolidação do inglês moderno inicial. Ainda existem formas verbais arcaicas como maketh e leadeth, mas a estrutura da frase é praticamente a mesma de hoje.


Esse período coincidiu com o Renascimento e com a invenção da imprensa, o que ajudou a padronizar a ortografia e a difundir o idioma escrito. Foi também a época de William Shakespeare, que expandiu o vocabulário inglês de maneira extraordinária, criando ou popularizando centenas de palavras e expressões que permanecem em uso.


A Bíblia King James, publicada em 1611, foi um divisor de águas porque fixou o inglês em uma forma elegante e acessível. Sua linguagem poética influenciou a literatura, a religião e até o modo de falar cotidiano. O idioma já não era apenas da Inglaterra: começava a se espalhar com o comércio marítimo e as colônias.


Modern English (1989)

Chegamos então à versão contemporânea:“The Lord is my shepherd, I lack nothing. He lets me lie down in green pastures. He leads me to still waters.”


As formas verbais se simplificaram: maketh virou makes, leadeth virou leads. O vocabulário é direto e o tom é mais natural. A clareza é prioridade. O inglês moderno é o resultado de séculos de contato com outras culturas, globalização e revoluções tecnológicas.


O século XX e XXI trouxeram novas ondas de mudança. A influência americana transformou expressões, sotaques e vocabulário. A internet e a mídia digital aceleraram esse processo, gerando neologismos constantes — stream, selfie, download, influencer. A língua passou a evoluir quase em tempo real, moldada pela comunicação global.


Por que as línguas evoluem?

Línguas mudam por três motivos principais.Primeiro, porque as pessoas mudam. As palavras refletem novos costumes, ideias e tecnologias. À medida que a cultura se transforma, o idioma acompanha.


Segundo, porque línguas entram em contato. Comércio, guerras, imigração e hoje a internet misturam expressões e sons. O inglês, por exemplo, absorveu vocabulário do francês, do latim, do grego e, mais recentemente, de línguas globais como o espanhol e o japonês.


Terceiro, porque as pessoas buscam simplificar. Ao longo dos séculos, o inglês foi perdendo terminações verbais, gêneros e declinações que complicavam o uso. Essa simplificação torna a comunicação mais rápida e eficiente.


A mudança linguística é inevitável. Mesmo quem tenta “preservar” uma língua acaba participando de sua transformação. O que hoje chamamos de erro pode se tornar norma em poucas gerações. Palavras que soam estranhas agora talvez sejam naturais para os falantes do futuro.


Uma língua viva

A comparação do Salmo 23 mostra que o inglês é um organismo vivo. Ele cresce, se adapta, se simplifica e se enriquece. Passou de um idioma tribal germânico para a língua global da ciência, dos negócios e da internet.


Cada fase — Old, Middle, Early Modern e Modern English — revela não apenas mudanças linguísticas, mas também transformações culturais profundas. O inglês da era anglo-saxônica refletia isolamento; o do período normando, dominação; o do Renascimento, expansão intelectual; e o contemporâneo, globalização.


As línguas evoluem porque nós evoluímos. Cada palavra é um registro vivo da história humana. Ler o Salmo 23 nas quatro versões é como ver o tempo passar diante dos olhos — é perceber que a língua não pertence ao passado nem ao futuro, mas ao presente de quem a fala.

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